Para muitos pais, parece tão difícil
dizer ene, a, o, til.... Mas saiba que é extremamente importante para seu filho
ouvir simplesmente não
Texto Carolina Tarrio
Explique o motivo do não, para que seu filho entenda as regras
valorizadas em casa
"Sabe qual é a maneira mais certa de deixar
seu filho infeliz? Acostumá-lo a receber tudo." Essa frase foi
escrita pelo filósofo Jean-Jacques Rousseau, no livro "Emílio ou Da
Educação", em 1762. E não é que continua valendo hoje? Segundo
Rousseau, se você der tudo a uma criança, seus desejos só
farão crescer devido à facilidade em satisfazê-los e ela terá
de lidar então com sua própria ansiedade, com sua tirania e com a decepção de
o pai, em algum momento, parar de atendê-lo, já que satisfazer tudo
é impossível. "São sentimentos muito mais difíceis de administrar para uma
criança, e que causam mais dor do que simplesmente ter um desejo negado",
diz Rousseau.
Ajudar os filhos a lidar com as frustrações e orientá-los
sobre o que é razoável ou não os torna mais seguros e flexíveis. As crianças
precisam aprender que suas atitudes têm consequências e que elas não podem
fazer tudo o que quiserem. "Frustrar determinadas expectativas, dizer não,
é ensinar. Essa é uma função paterna e materna, faz parte de educar", diz
Magdalena Ramos, terapeuta de casal e família e autora do livro "E Agora o
que Fazer? A Difícil Arte de Educar os Filhos", da editora Ágora.
O não é sempre uma frustração
de uma expectativa ou desejo - e não há como aliviar isso. O que acontece é que
são essas frustrações que formam o caráter da criança, ensinando-a a buscar de
forma criativa outras maneiras de se sentir satisfeito e percebendo que é
possível suportar uma espera ou mesmo a não realização de seu desejo.
"Isso torna a criança mais forte para as intempéries que certamente a
própria a vida lhe trará", diz Rosana. Dizer não faz parte, e é bom para o
seu filho. Então, que tal aprender a fazer isso, sem culpas? Eis algumas
orientações para guiar você nesse importante caminho.
Na vida, sempre será
preciso enfrentar frustrações e respeitar limites. As crianças precisam estar
preparadas para isso. É melhor que elas aprendam em casa, com seus pais, em um
ambiente no qual sabem que são amadas e se sentem protegidas do que fora, ou
muito mais tarde, quando a queda pode ser maior.
Escolha os
"nãos" que você vai dizer. Pense quais são os pontos realmente importantes,
de que você e sua família não abrem mão: a hora do sono? A comida? Situações
que colocam em risco a segurança da criança, os bons modos, o respeito aos mais
velhos? Não dá para dizer "não" o tempo todo e as crianças
experimentam e fazem pequenas besteiras. Você pode deixar passar as bobagens ou
tratá-las de modo menor. Mas algumas coisas, as realmente importantes, têm de
estar bem marcadas e claras.
"A melhor forma
de dizer um não para o seu filho é apenas dizê-lo quando você estiver seguro de
que é um não mesmo, que não vai virar um sim depois", diz a psicóloga
Rosana Augone. Ou seja, é preciso ter coerência ao dizer não, para que a
criança possa ir aprendendo. Não dá para proibir uma coisa um dia e, no outro,
por estar cansado ou para não armar uma briga, ceder.
É importante que os
pais combinem esses "nãos" juntos, ou que se falem antes de dar uma
resposta, para que a criança não fique perguntando para um e depois para o
outro e manipulando a situação.
Seu filho pequeno não
precisa ter tantas escolhas, isso é angustiante para uma criança. Não faça
muitas perguntas ou deixe muitas decisões para ele tomar, isso desorienta.
"Alguém de 2 anos não pode decidir o que vai vestir, por exemplo",
diz Magdalena. "Porque vai escolher a roupa mais nova ou uma fantasia ou a
de determinada cor, sem levar em conta o tempo, o frio que faz, aonde vai. Essa
não é uma decisão para uma criança." A tomada de decisões deve ser
ampliada de acordo com a autonomia e a maturidade da criança.
"Cada idade tem
seus "nãos". Uma criança de 3 anos pede "nãos" e
consequências mais contundentes e imediatas que uma criança de 6 ou 7 anos, que
já consegue negociar e já não faz tanto uso da birra. Já o adolescente precisa
de "nãos" e consequências muito claras, pré-combinadas e justas"
diz Rosana Augone.
Birras em público
parecem ser as "preferidas" das crianças, porque a probabilidade de
os pais cederem é maior. As crianças sabem disso e os pais ficam com muita
vergonha. "Nestas situações, o melhor é se retirar para um local o mais
privativo possível, abaixar, segurar seu filho pelos braços com firmeza, mas
sem machucar, pedir para ele olhar nos seus olhos e dizer o que ele precisa
fazer, por exemplo: parar de gritar, não se jogar no chão, etc.", orienta
Rosana Augone. Ao dizer um não, o tom de voz, a altura de que você fala e a
linguagem tem de ser clara. Depois de deixar claro isso, tente chamar a atenção
da criança para outra coisa.
Existem situações em
que a criança "pede" o não, testa se aquele combinado é para valer e
quer saber se os seus pais estão prestando atenção nela, se estão vendo que ela
está ou não cumprindo o combinado. Ela quer ouvir de novo aquele não de seus
pais para reafirmar o que é certo e sentir-se segura. Essa é a hora de não
titubear.
É normal seu filho
ficar com raiva de você ao receber um não. Respeite essa raiva. Tolere-a. Saiba
que isso faz parte de sua educação e que aprender a ouvir não e lidar com eles
fará dele uma pessoa mais feliz e flexível.
Não é porque o seu
filho sabe argumentar bem, explicar razões, que o argumento dele vale mais que
o seu. Ele precisa saber que não é ele quem decide determinadas coisas, por
mais que as queira ou as entenda.
Não se deixe levar
pela culpa, achando que você tem de dar mais, fazer mais pelo seu filho. Mas
esteja lá quando puder. Se você tem pouco tempo para estar com seu filho, faça
desse tempo um tempo de qualidade, estando de mente e corpo presente.
"Muita gente faz de conta que brinca com o filho, mas na verdade está
olhando mensagens no celular ou pensando em coisas de trabalho", diz
Magdalena. Dê atenção à criança e, quando não puder, diga claramente que
naquele momento não dá.
Às vezes, seu filho
quer muito algo (ir a uma festa, assistir a um determinado programa ou ganhar
um objeto caro, por exemplo). E todos os outros pais da escola, mesmo que
alguns até achem inadequado, cederam. "Não é nada fácil fugir da
influência da mídia e dos outros", diz a psicóloga Rosana Augone.
"Mas explicar ao seu filho porque você está dizendo aquele não, porque
você não concorda com a maioria e deixar claro como sua família pensa e no que
credita é da maior importância para a construção moral dele".
Fonte: educarparacrescer.abril.com.br
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